terça-feira, 11 de setembro de 2012

Depressão...


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Depressão...

Depressão é uma das piores doenças que existe. É através dela que nascem muitas outras. A depressão pode não ter cura e não é compreendida. Há pessoas que não entendem o porquê de outras, aparentemente saudáveis, fecharem-se em casa e não terem vontade de fazer nada, nem mesmo de fazerem amigos ou conversarem com alguém.
Anne passa os seus dias sentada no sofá da sala fumando e olhando a televisão. O marido faz tudo para ela. Há quem critique os dois: um por não fazer nada o outro por ser bom de mais. Lidar com uma pessoa com esta doença nunca é fácil. A mais pequena coisa dita ou feita por quem à sua volta vive, pode pô-la de rastos, pois essa coisa poderá ser pequena para alguns mas para ela é grande: traz-lhe o passado de volta, sendo através dele que a enfermidade lhe entrou pela porta dentro.
Anne nasceu e foi criada na Inglaterra, veio para o Canadá na sua adolescência, casou nova com um canadiano francês, do norte de Ontário. Um charmoso que só pensava nele próprio, na bebida e nas amantes. Deu-lhe três filhos, maus tratos e fome.
Anne viu-se desesperada sem saber para onde ir, com três crianças, com apenas um ano de diferença de idade, numa terra em que bem poucos falavam a sua língua. No Norte de Ontário ainda hoje, algumas pessoas mais idosas não falam inglês, apenas o francês. Quando a pancadaria chegava, gritava por socorro mas ninguém acudia. “Entre marido e mulher não se meta a colher”, como costumam dizer.
Um dia ele a levou para passarem um fim de semana numa pequena casa à beira do rio Mattagami. Ela, com medo foi e, sem ele ver, disse ao dono da casa: - “Por favor socorra-me se eu gritar”. De noite o homem ouviu seu clamor e, com pena dela, livrou-a das garras do marido.
Após essa noite Anne separou-se do marido e foi viver sozinha com as crianças.
Jeremias, o dono das cabanas, homem maduro, solteiro, depois de defender Anne apaixonou-se por ela. Todos os dias a auxiliava com algo, até que um dia a pediu em casamento. Anne aceitou apesar de ele ser mais velho do que ela uns vinte anos. Junto dele encontrou um lar para si e as crianças. Todavia, mesmo não sendo ele o amor da sua vida, foi feliz por vários anos.
Enquanto criou os filhos teve uma vida normal, não se via nela resquícios de depressão, mas ela estava lá no fundo, fruto do seu passado, da imigração, quiçá da sua infância, que desconheço. Trabalhava em sua casa no curtimento de peles de castor, que Jeremias caçava, fazia lindas toalhas de mesa em croché, era uma mulher activa em todo o governo do seu lar.
Com os filhos criados e fora de casa, Anne começou a sentir uma grande lacuna dentro de si e, sem dar por isso, foi atacada pela depressão. Ainda consultou alguns médicos, que mais tarde se recusou voltar a ver, acabando se viciando no álcool, no cigarro e no abandono de todas as sua actividades.
Hoje, Anne passa os dias como já descrevi no início, não cuida da sua casa, apenas fuma e bebe, se encontra algo para beber. Jeremias tenta não levar álcool para casa, contudo alguma amiga traz-lhe de beber de vez em quando.
Tem dias em que Anne tenta encontrar uma luz para o seu viver. Mesmo não limpando a casa, anda com os móveis às voltas. Muda as cadeiras na sala, a mesa da cozinha para a casa de jantar e a do jantar para a cozinha. Gosta de fazer compras, algo para ela, roupas de cama, mesmo sem precisar, plantas e flores plásticas para dar um colorido aos seus dias. Veste-se e pinta-se como se fosse para um baile, apenas para se sentar no sofá da sala.
Há quem critique Anne. Uma estragada que não sabe poupar o pouco que o pobre Jeremias ganha na venda de “minows”, pequenos peixes que ele, ainda de madrugada, já com os seus setenta anos, vai apanhar nos lagos para vender aos pescadores. Censuram-na porque não entendem o que a depressão faz com as pessoas. A depressão vai-as minando, devagarinho e, por vezes, aos que vivem à sua volta. Só quem sofre desta doença pode entender um pouco Anne e o que a depressão faz dela, ou com qualquer outra pessoa que sofra do mesmo mal.
Eu própria entendo Anne e temo que um dia essa doença desperte dentro de mim como no passado. Sei que ela está adormecida em qualquer canto do meu ser e, que, a qualquer momento, por uma pequena coisa, pode despertar. Por isso tento andar devagar, vivendo um dia de cada vez, fazendo o melhor que posso, para não a acordar.

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